O divino e o monstruoso na literatura: movimentações religiosas e a análise das representações dos monstros nos folhetos ingleses modernos
Palavras-chave:
Monstruosidade;, Religião;, Representação;, Inglaterra Moderna; Impressos;RESUMO
O presente artigo tem por objetivo o trato das representações dos monstros a partir da chamada “literatura de rua” inglesa. Embasando-se nos impressos dispostos na coleção “Early English Books Online”, objetiva-se entender em que medida a apreensão do monstruoso modificou conforme o escopo religioso e cultural de cada sociedade. Nesse prisma, focaliza-se as coadunações desse cenário com as transformações religiosas da Inglaterra Protestante, denotando à região uma particularidade. Para tanto, o trabalho vale-se de uma análise das representações e da linguagem para o trato representativos do monstruoso, buscando evidenciar as suas correlações com um dado discurso teleológico e cultural. Ao fazer isso, à luz de Roger Chartier (1991) e Pierre Bourdieu (1989), pensa-se a dimensão simbólica, linguística e representativa desses materiais, tendo em vista sublinhar o papel da literatura impressa, bem como as relações desses documentos com a circulação de um dado topos sobre os monstros. Desse modo, delimita-se um esforço de compreensão das narrativas monstruosas do século XVII, buscando elucidar como o monstruoso desponta em meio a uma linguagem própria e a um cenário histórico distinto - caótico e de “ponta-cabeça” - recaindo em reformas, tensões, jogos de poder e eclosão de Guerras Civis.
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